Opinião
Os crimes da ditadura
por José Carlos Teixeira Giorgis
por Redação JM
A proclamação da República não fez cessar os conflitos institucionais e pessoais. Exemplo disto, no Rio Grande, foi a Revolução de 1893. Enganam-se muitos em pensar que o Pacto de 23 de agosto de 1895 tenha pacificado federalistas e republicanos. Ao contrário, as escaramuças continuaram, assim como as perseguições políticas com prisões arbitrárias, empastelamento de jornais, saques de propriedades, incêndios de residências, espancamentos, assassinatos, estupros, torturas e numerosas degolas, segundo lista do escritor Gunter Axt.
De um lado os governistas de Júlio de Castilhos, apoiados pela Constituição Estadual de 1891 e legislação correlata; de outro os federalistas de Silveira Martins, com o espírito liberal de seu partido, as regras do Partido Federalista, o parlamentarismo e forte oposição à tirania do “dragão” castilhista. O que se prolongaria mesmo nas eleições nacionais de 1910, quando Bagé, São Gabriel e Soledade foram as únicas cidades em que Rui Barbosa vitoriou-se perante Hermes da Fonseca.
Tal era o clima. Os jornais “O Maragato” e “Canabarro” eram publicados em Rivera e solicitavam a quem soubesse dos crimes do castilhismo que os denunciasse aos periódicos. Esse elenco de arbitrariedades foi reunido em livro-denúncia, “Os crimes da ditadura”, de exemplares raros.
Todavia o Projeto Memória do Ministério Público do RS conseguiu resgatar pedaços espalhados da obra, inteirando-a sob a coordenação percuciente do historiador Corálio Cabeda, e onde são retratados os ilícitos penais, muitos deles acontecidos em Bagé, Lavras, Cacimbinhas, Dom Pedrito e localidades outras próximas das fronteiras com o Uruguai e Argentina, para onde fugiam os federalistas.
Segundo Axt, a violência atingiu todas as classes, estancieiros, comerciantes, altos dignitários, peões, colonos imigrantes (aqui um bom número de italianos entre as vítimas), estrangeiros, mulheres e crianças), um verdadeiro “banho de sangue”. E na obra evidencia-se a prática da degola como forma de vingança, fato que acontecia, muitas vezes, depois que a pessoa já estava morta, como humilhação, ficando os cadáveres insepultos. Para os seguidores de Castilhos vigorava o refrão “Não se prende um republicano por matar um maragato”. Dois dos mais cruéis adeptos disso, Bernardino Mota e Leonel Rocha, estiveram homiziados em Bagé, sob a proteção do governo de José Octávio Gonçalves.
O primeiro, mais tarde já sob o desprezo do “Dragão”, acabou fugindo para o Uruguai. Algumas instituições, como a Brigada Militar, a Maçonaria e o Exército, serviram de refúgio e abrandamento destes atos. Euclides Moura também editou trabalho similar, “O vandalismo no Rio Grande do Sul (Pelotas, 1892)”. A seguir algumas das tristes notícias publicadas.
(3.11.1892) – “Infamíssimo assalto à casa residência do Coronel José Facundo da Silva Tavares, em Porto Alegre, de madrugada, sendo os assaltantes comandados pelo Alferes Marçal e estando à frente do movimento o Comandante da Brigada Militar. São mortos à bala dois filhos de Facundo, um de 29 anos (José) e outro de 21(Facundo). A esposa e uma filha milagrosamente escapam de ser assassinadas, e o Coronel Facundo, de bombacha de chita, chinelos e camiseta, é arrastado até a cadeia. Os bárbaros fatos deram-se a poucos passos da residência do General Pego Júnior, primeira autoridade militar do Estado (Notas: Facundo era irmão de Joca Tavares/ Era Comandante da Brigada o Major Joaquim Pantaleão Telles. / O General Antônio José Maria Pego Júnior era Comandante do 6º Distrito Militar e respondeu à Corte Marcial por haver abandonado Curitiba às forças de Gumercindo Saraiva).”
(22.04.1890) - “Chegam a Bagé, após maus-tratos que sofreram pelo caminho, os primeiros cidadãos recrutados no interior.”
{AD-READ-3}(13.05.1890) – “ Deposição do Francisco da Silva Tavares, que havia substituído Frota no dia 5 do mesmo mês (Nota: Francisco era irmão de Joca Tavares. Substituiu o militar Anacleto Falcão de Frota no governo do RS, de que renunciou pouco dias após, por incompatibilizar-se com Castilhos).”
(Cont.)