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Opinião

Foram-se as memórias de tempos passados

Em 20/07/2024 às 00:59h

por Redação JM

Foram-se as memórias de tempos passados | Opinião | Jornal Minuano | O jornal que Bagé gosta de ler
Foto: Arquivo Pessoal

Dizem que os nascidos em julho, ou "cancerianos", gostam de juntar documentos, fotos, lembranças. É fato. Há oito anos, em meu apartamento, não havia mais espaço para isso e os livros. Resolvi, então, entregar parte deste "acervo" para a guarda de uma empresa, com a pretensão  de lhe dar outro destino. Aluguei, assim, dois "box", espécie de contêineres, e ali depositei cerca de 64 volumes, encadernados, com meus acórdãos que almejava, depois, levar para o Arquivo Público de Bagé. E mais: quase setenta pacotes com outros habitantes: cartas, ofícos, projetos de livros, textos de palestras, CDs, cassetes, discos, fotos, revistas, acórdãos do Tribunal de Alçada, etc. E uma cadeira que sobrara do antigo Beira-Rio, com meu nome.

Como bom retardatário, fui "esquecendo" de buscar as caixas e enviar os conteúdos para os destinatários escolhidos. Aí vem a enchente. A foto diz tudo. Não sobrou nada da água e do xixi dos ratos. Minto. A cadeirinha de ferro sobreviveu.

A possibilidade de infecção por leptospirose impediu qualquer outra salvaguarda. Foi-se, descartado ao lixo, um acervo de mais de trinta anos. Foram-se as memórias de tempos passados. Agora é começar tudo de novo.

Ando pesquisando outro local para preservar o que ainda acumulei e que ora abarrota minha casa. Canceriano se apega muito.

Quando lá fui visitar o espólio umedecido e já mal cheiroso, soube de uma história dolorosa. Falecera o filho jovem de uma senhora que resolveu conservar intacto o quarto dele. Fechava-se na peça sempre que sentia lembrança do filho. Preocupados, os demais familiares, depois de algum tempo, consguiram que ela levasse o conteúdo do quarto e montasse réplica num box grande da empresa guardadora.

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Frequentemente a senhora lá ia, abria o box, assentava-se, rezava, e depois de algumas horas ia embora. Passava, assim, momentos de saudades na solidão do ambiente, seu único lenitivo.

Mas, como diz o poema de Clóvis Assumpção, "as águas não têm memória". E varreram de sobrevivência os suspiros que ainda persistiam na peça. Feneceu a nostalgia táctil, persistirá a recordação fluida que não desaparece jamais.

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