JM: 30 ANOS
Cláudio Falcão fala sobre o papel desempenhado pela charge na trajetória do periódico
por Luís Mário Pereira
Na série de entrevistas dos 30 anos do Jornal Minuano, Cláudio Corrêa Falcão de Azevedo, figura emblemática que enriqueceu as páginas do impresso com suas ilustrações ao longo de duas décadas, fala sobre o papel desempenhado pela charge na trajetória do periódico.
Com uma habilidade de comunicação que transcende as palavras, Falcão, como é conhecido, aos 65 anos, é uma figura viva na história de três décadas do Jornal Minuano. Com seu carisma especial, bigode peculiar e uma fala que mescla classe e simplicidade, visitou a redação do jornal, trazendo emoção e nostalgia aos colegas. Sobre a saudade do trabalho, Falcão diz emocionado: “aqui é saudade do jornal, mas eu digo, de tudo, da charge, inclusive".
Médico veterinário de formação, graduado em 1981 pela então Faculdades Unidas de Bagé (Funba), hoje Urcamp, tornou-se conhecido em sua cidade natal por sua vocação singular: a arte de comunicar. Desde meados dos anos 1990, ele dividiu sua rotina entre as atividades do campo, redação de jornais e suas incursões nas telas e na publicidade.
Sua história como chargista começou na década de 1990, no já extinto Jornal Correio do Sul, marcando o início de uma trajetória que moldaria o panorama jornalístico local. Na década de 80, trabalhou na Cobagelã e teve uma breve incursão como professor substituto na disciplina de Bovinocultura de Corte na Urcamp, ampliando seus laços com a universidade que o convidaria, em 2001, para integrar-se oficialmente como chargista do Jornal Minuano, permanecendo até 2021.
Quando questionado sobre quando foi notado o talento pelo desenho, Falcão diz que ‘a gente começa a notar na escolinha’. “Todas as crianças desenham no caderno. O meu desenho era o melhorzinho, um pouco. Desenhava os colegas, fazia o jornalzinho da aula. Mas, nunca, na minha vida, pensei em me dedicar ao mundo do jornalismo, da comunicação. No entanto, foi por isso que as pessoas começaram a me conhecer aqui em Bagé", reflete.
As inspirações para seus personagens, Florêncio e Castora, que ilustraram suas charges por anos, tanto no Correio do Sul como no Minuano, segundo ele, são derivadas de pessoas reais em sua vida. “Um mix de memórias de várias pessoas que eu conheci do meio rural”, disse.
Falcão lembra de momentos marcantes com seus leitores, inclusive a vez que recebeu uma escultura de madeira com seus personagens. Ele aborda a possibilidade de publicar um livro com suas charges, já que são, segundo ele, cerca de cinco mil obras que ele tem guardadas.
Ao longo de sua carreira, Falcão demonstrou que a charge não busca apenas criticar, mas também despertar consciências. É uma crítica construtiva que aponta para um futuro melhor. "Com o poder da caneta vem a grande responsabilidade de usar o humor com sabedoria e respeito. Cada desenho carrega consigo uma mensagem que pode influenciar muitos," aponta.
Falcão destaca que sua maior fonte de inspiração no mundo da ilustração é o renomado artista argentino Florêncio Molina Campos, conhecido por suas marcantes ilustrações nos almanaques da icônica marca Alpargatas, mas reconhece que ‘a família Falcão sempre foi muito ligada à arte’. “Notadamente à música. Minha irmã mais velha é uma excelente pintora e desenhista. Não deste setor de charge. Retratista, se é que se pode falar assim e algumas tias e tios avós que pintavam também”, ressalta.
Ele explica que a inspiração para uma charge pode surgir a qualquer momento, em uma conversa casual ou até mesmo em uma manchete de jornal. Em sua passagem pelo Jornal Minuano lembra que passou por vários editores nos quase 20 anos que trabalhou. “Ninguém me tutelava. Confiavam, digamos, no meu sentimento de adequação. Nunca exagerei na pimenta, ou seja, não criava polêmica”, enfatiza.
Para criar uma charge é preciso estar atento e aberto ao mundo ao nosso redor. Assim, o trabalho não se torna não apenas uma forma de entretenimento, mas também uma poderosa ferramenta de análise e crítica social, capaz de gerar reflexões profundas e promover mudanças positivas na sociedade. “A minha função como chargista não é ser ilustrador de panfleto. Mas através da notícia dar um certo ar de humor para o dia”, pontua.
Uma leitora ficou marcada em sua memória contando sua história como apreciadora de suas charges no jornal. “Eu estive anos retirada de tudo, muito triste, vivia dentro de casa e tu foste a inspiração. A única pessoa que me fez voltar a sorrir”, lembra com carinho das palavras da leitora que havia sido sua professora na infância. “Uma coisa tão simples, mas que claro, tu sendo um chargista, esse é o teu objetivo diário. Mas eu não sei se foi porque era ela. Não tem medalha no mundo. Eu acho que a consideração das pessoas que a gente gosta é a melhor”, aponta.
Falcão recorda também de muitas pessoas que recortavam suas charges e colecionavam. “Um barbeiro aposentado que tinha um hobby de fazer escultura em madeira fez o Florêncio e a Castora e me deu de presente. Tenho guardado, vai ficar no meu galpão”.
{AD-READ-3}O chargista já participou de Mostras de suas charges, uma coletiva e outra individual. Além de fazer diversas oficinas de desenho e ilustração. “Muitas pessoas me cutucam para fazer um livro” deixa a ideia no ar.
Para finalizar a entrevista, Falcão desenhou mais uma vez seus personagens Florêncio e Castora em homenagem aos 30 anos do Jornal Minuano.