Opinião
A verdade e a mentira
por Greice Martins | Escritora
por Redação JM
Fiz a opção de não mentir. Já aviso que é difícil. Já ouvi comentário de um amigo: Ela é tão verdadeira que se pensa até que está mentindo.
Um fornecedor de grãos, que me perguntou como havia sido a produção da lavoura, respondi não ter sido boa. Caiu-lhe o queixo com a minha resposta. Disse-me: Só a senhora para dizer a verdade. Os outros vêm aqui e mentem. Só que não adianta, eu sei de tudo.
Tem mentiras famosas, as ditas sociais. São fáceis de resolver, sem magoar o outro. Ter tato, sem transigir. Cito dois exemplos: Tinha marcado um evento com uma amiga e telefonei: 'Não vou poder ir, pois chegou um padre amigo do interior para jantar'. No dia seguinte ela me liga: 'Mas que mentira bem inventada!' A mesma amiga disse-me que mentia sempre, pois ninguém tinha que saber da sua vida. Saiu-se com essa pérola: 'Desculpe-me, interrompeu a ligação porque meu celular caiu na sopa'.
Ariano Suassuna, o famoso escritor nordestino, fez a apologia da mentira de forma irônica e divertida. Disse que mentir para prejudicar as pessoas é condenável, mas mentir por amor à arte é uma prática por ele muitas vezes adotada. Citou o exemplo de mentiroso lírico. Um amigo, cujo pai era apicultor, conseguiu dobrar a produção de mel através do cruzamento de abelhas com vagalumes. O híbrido resultante, por possuir lanterna, trabalhava também à noite...
Mesmo procurando nunca mentir, reconheço que existem perguntas difíceis de responder. Sobre saúde, por exemplo. Meu pai, tão doce, ao sofrer um AVC grave, ficou com sequelas inclusive na fala. Foi há muitos anos, não contávamos com as terapias de hoje. Tivemos que improvisar. Veio o massagista do time amado, o Bagé, do qual fora presidente e patrono. Uma professora de português, em substituição de especialista em fonoaudiologia, e assim por diante. Para atender à sua ansiedade sobre o prognóstico da dificuldade de falar, optei por fazê-lo rir: Mas, papai, nunca falaste e agora queres falar?
Existem, porém, exceções. São situações graves, onde a verdade é desbancada pela caridade. Fala-se muito em narrativas versus realidades. Nós, os gaúchos, não combinamos muito com isto. Para nós é pau pau, pedra pedra.