E a educação, Leite?
Recentemente, o jornal O Globo publicou um editorial em que pretende enaltecer e corroborar os resultados de uma pesquisa sobre políticas públicas em educação realizada pela Fundação Getúlio Vargas, do Rio de Janeiro, e encomendada pela Fundação Lemann, uma das instituições, como sabemos, inspiradoras do pensamento do governador Leite. O resultado da pesquisa é claro: a qualidade da educação está associada a maiores taxas de crescimento econômico e a melhoria do ensino poderia impactar o crescimento anual em mais de dois pontos.
Talvez o governador não conheça a pesquisa, embora seja muito difícil que não conheça a relação da qualidade da educação com o crescimento econômico, algo já dito em mais de um estudo e, agora, consolidado pela pesquisa da FGV. Mas se conhece, como explicar a trágica gestão que desenvolveu no seu primeiro mandato?
Senão, vejamos: em um relatório de reinício de gestão, a secretaria da educação do Estado apresentou dados inacreditáveis sobre a situação estrutural das escolas públicas no Rio Grande do Sul. Das 2311 escolas analisadas, apenas 99 estavam em bom estado, sem necessidade de reparos; 176 precisavam de reparos urgentes para poderem receber os alunos e 1898 de reparos em problemas graves, tais como sistema elétrico e hidráulico. É certo que com uma rede deste tamanho, sempre haverá reparos necessários e obras com algum grau de urgência. Mas o quadro apresentado pelo governo é de total falência da rede física de ensino. O que aconteceu? O governo de Tarso Genro, concluído há pouco mais de oito anos, investiu R$ 402 milhões na ampliação, recuperação e qualificação das escolas gaúchas, legando aos sucessores uma estrutura física compatível com as necessidades do ensino. Como explicar, então, tamanha deterioração em tão pouco tempo?
Não é só isso: ao final de 2014, último ano do governo de Tarso, os professores emergenciais representavam 13,1% do magistério; hoje, chegam a 45%, quase alcançando em números absolutos os efetivos. Não precisa ser especialista para entender que vínculo transitório e emergencial não cria o mesmo vínculo para o aprendizado. Não bastasse isso, é evidente que houve um grande arrocho sobre os professores. Ao final de 2014, os professores representavam 68% de todos os vínculos de servidores do Estado e 47,4% dos salários. Em dezembro de 2022, eram 66% dos vínculos (praticamente igual), mas apenas 38% dos salários. Como se vê, a narrativa do pagamento do piso é uma grande enganação, usada para legitimar uma prática de arrocho salarial sistemático.
Creio que a explicação está na total desconsideração que a educação teve nos dois governos que sucederam a Tarso. Sartori nunca escondeu e chegou a encaminhar os professores à Tumelero em busca do piso salarial. Já Leite, trouxe uma técnica de fora para gerenciar a educação gaúcha, certamente sem tempo nem disposição para verificar in loco a situação das nossas escolas do Rio Grande profundo.
O resultado desta negligência reiterada de dois governos, que são continuidade um do outro, gerou isso que estamos vendo: goteiras, falta de água, inexistência de banheiros, refeitórios e cozinhas desmantelado, cabos elétricos deteriorados, professores descontentes, vínculos pedagógicos frágeis, enfim uma gama de deficiências que impactam, certamente, a educação, não para aprimorar a sua qualidade, mas para regredir o desempenho dos alunos.
E Leite não pode reclamar de herança maldita.