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As madeleines

Em 12/11/2024 às 00:08h, por José Carlos Teixeira Giorgis

Acontece durante a caminhada na praça; ou numa praia andando pela areia fofa. De repente, como uma aragem que acaricia, um som vago ao longe. É a sensação de outono, como o novelo que escorrega, o café que fumega, a vista escusa. Uma lembrança (música ou verso?), um instante na porta que abre, talvez o sorriso; ou quem sabe a fronte triste. E aí acode a lembrança, ganha forma e solidez. Mas Marcel Proust concebe essas “memórias involuntárias” no prosaico proveito das madeleines do chá de sua tia. Contam que num jantar promovido pelo rei de Lorena, o “patissier” desaparece. Uma serviçal assume a missão elaborando um biscoito em concha típico de Commercy (ovos, açúcar, raspas de limão, sal, farinha) que agrada ao monarca e convidados. Indagada disse chamar-se Madeleine e o nome é adotado para o quitute (“ou “madalenas”, na tradução de Mário Quintana). Outros atribuem a freiras do convento para Maria Madalena. Vale transcrever o trecho clássico de Proust:

“Ela então mandou buscar um desses biscoitos curtos e rechonchudos chamados madeleines, que parecem ter sido moldados na valva estriada de uma concha de São Tiago. E logo, maquinalmente, acabrunhado pelo dia tristonho e a perspectiva de um dia seguinte sombrio, levei à boca uma colherada de chá onde deixara amolecer um pedaço de madeleine. Mas no mesmo instante em que esse gole, misturado com os farelos do biscoito, tocou meu paladar, estremeci, atento ao que se passava de extraordinário em mim. Invadira-me um prazer delicioso, isolado, sem a noção de sua causa. Rapidamente se me tornaram indiferentes às vicissitudes da minha vida, inofensivos os seus desastres, ilusória a sua brevidade, da mesma forma como opera o amor, enchendo-me de uma essência preciosa; ou, antes, essa essência não estava em mim, ela era eu. Já não me sentia medíocre, contingente, mortal. De onde poderia ter vindo essa alegria poderosa? Sentia que estava ligada ao gosto do chá e do biscoito, mas ultrapassava-o infinitivamente, não deveria ser da mesma espécie.

E de súbito a lembrança me apareceu. Aquele gosto era o do pedacinho de madeleine que minha tia Léonie me dava aos domingos pela manhã em Combray (porque nesse dia eu não saía antes da hora da missa), quando ia lhe dar bom-dia no seu quarto, depois de mergulhá-lo em sua infusão de chá ou de tília. À vista do pequeno biscoito não me recordara coisa alguma antes que o tivesse provado; talvez porque, tendo-o visto desde então, sem comer, nas prateleiras das confeitarias, sua imagem havia deixado aqueles dias de Combray para se ligar a outros mais recentes; talvez porque, dessas lembranças abandonadas há tanto fora da memória, nada sobrevivesse, tudo se houvesse desagregado; as formas – e também a da pequena conchinha da confeitaria, tão gordamente sensual sob as suas estrias severas e devotas – tenham sido abolidas, ou adormentadas, haviam perdido a força de expansão que lhes teria permitido alcançar a consciência. Mas, quando nada subsistisse de um passado antigo, depois da morte dos seres, depois da destruição das coisas, sozinhos, mais frágeis, porém mais vivazes, mais imateriais, mais persistentes, mais fiéis, o aroma e o sabor permanecem ainda por muito tempo, como almas, chamando-se, ouvindo, esperando, sobre as ruínas de tudo o mais, levando sem se submeterem, sobre suas gotículas quase impalpáveis, o imenso edifício das recordações”.

Então, aguarde-se uma tarde marrom de outono. De preferência com ameaça de chuva tíbia. Encomende as madeleines. Molhe no chá ou na xícara do café coado. E deixe flutuar as memórias que se esconderam tão fundo que acreditaram não ser revisitadas jamais.

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