Richard Gere em Bagé
Muitos visitantes cantaram nossa cidade. Osvaldo Orico disse que era terra excepcional, de gente carinhosa e bela; Batista Luzardo proclamou que ela estava tinindo na campanha de Getúlio, presidente que elogiou a beleza de suas fêmeas; Correia Lima sinalizou sua alma espartana; Berilo Neves, que trajava bem; Dolores Cantera de Campos a comparou a uma feiticeira cheia de segredos; Poty Medeiros ressalta o altruísmo das mulheres e o valor de seus homens. Também prenderam o Lalau num motel e caiu o balão do americano. Quem não lembra o fantasma da panela do Candal ou o disco voador?
Até hoje há temor que se mexa um monstro que dorme embaixo da capela são Sebastião; foram inesquecíveis os comícios de Juscelino, Jânio, Brizola; de Pasqualini e seu terno branco; em algum lugar ainda ressoa a voz de Pedro Moacir; ou de Silveira Martins. A chegada de Cauby Peixoto foi apoteose; o pessoal invadia pelas janelas do Caixeiral, as meninas arrancavam pedaços das roupas do cantor, naquela época tinha bigodinho, chapéu. E já botava a honra da Conceição na rua.
Quando veio o Trio Los Panchos no Cine Avenida os ingressos esgotaram cedo, muitos ficaram ouvindo da rua as dores da Espinita, as batidas do relógio, a barca que estava de partida, o sabor a ti. Ah, os velhos boleros. O Omar Shariff não deu muita bola para os patrícios, nem se dignou sair dos haras, onde pousou num jato executivo. Ficou por lá jogando cartas, fumando narguilé; desprezou uma lista de pacientes que desejavam consultar com o doutor Jivago. Agradável foi o Lupicínio Rodrigues que veio fazer uma apresentação na Cacimba e acabou cozinhando para o Edmundo no atelier perto do Cantegril, onde morou por vários dias esperando seu cachê; e, dizem, ali compôs “Judiaria”. Sem alusões. Maria Dela Costa e Procópio Ferreira encheram o Capitólio. Assim como Xandu. Até Manga levou ao delírio as gurias na galeria Kalil quando aqui veio o Nilton Santos, Pelé, Ademir da Guia, época de fartura no futebol, a velha iluminação na Estrela Dalva.
Poucos sabem, contudo, que aqui também esteve Richard Gere, então namorado de conterrânea e festejada pintora internacional. Para alguns o fato é lendário, para outros a tristeza de não ter sacado uma foto na máquina digital (existia?) Ou colhido o autógrafo em papel de bloco. Dizem que uma tarde em conhecida padaria, um estrangeiro bonitão tentava fazer-se entender aos balconistas: queria comprar um “small bread”, um pãozinho, que se supõe ter gostado muito. E como não conseguia transmitir seu intento, abria as mãos em palma, afastadas, para traduzir seu desejo; até que uma esperta vendedora compreendeu que, em verdade, o cliente almejava o popular cacetinho, produto que em outras cidades causa constrangimento quando pedido, por óbvias razões. Além de adquirir seu objeto de apreço, o ator ainda levou outras criações locais como o pão de bico, o pão d’água, o biscoito dentinho, pão de mel, e retirou-se em paz.
Pois o personagem era, nada mais nada menos, que o gigolô americano dos filmes, sem as vestes tibetanas que envergou mais tarde, ou as cãs que o tornam hoje um ícone das damas (Minuano, 31.12.2008).