Mão leve
Quando mudei domicílio e encontrava conterrâneo a pergunta era a mesma, fostes assaltado? Ninguém passa limpo e puro pela capital. Também vivi bocado, embora restrito a episódios modestos. Vou às narrativas. Nos sábados ia ao centro encontrar grupo a quem devia acolhimento. Reunia-se à boca da Galeria Chaves, indo e vindo à cafeteria do fundo. Otávio Germano, Sylvio Ballvé, Marcelo Feijó, Antonio Carlos Rezende, Rubens Rosek, Hélio Arenhardt, Jaime Machado, Fernando Degrazzia, Antônio Landó e outros. A eles seguiu-se a turma das noites de segunda no Barranco.
É gratificante chegar-se numa cidade e ser abrigado. Pois, próximo do meio-dia, Jaime convida a subir a rua da Praia em busca do carro e carona dele. Lépidos e alegres vamos. De inopino, um repelão. Mão rústica rasga o bolso de minha calça, surripia a carteira e dispara. Uma sensação muito desagradável. O ladrão corre, e na fuga confere o conteúdo, apenas cartão de crédito e de visita. Vira-se, ofende-me, joga o objeto. Era a iniciação como vítima de tentativa de dano patrimonial.
Tempos depois, dia chuvoso, alguns do grupo dirigem-se ao Mercado para buscar seus veículos. Sentado à beira da calçada alguém, que suponho o guardador. E que se ergue. Quando abro a porta traseira acontece o insulto. Arrebanha, desta vez, uma niqueleira de plástico, apenas moedas a engordam. Aqui, como troco, recebe bons golpes de guarda-chuva dos companheiros. Mas também ele reprova o insucesso da subtração, arremessando o modesto saquitel; e de juros, brinda-me com sonoros fdps.
Findo a narrativa na metrópole, com derradeiro fato. Distraído, miro vitrina. Uma mãozinha boba, voto de promissor punguista, delicadamente retira a cédula de dez reais que guardava para a lotação. Desta vez tive de sorrir pelo cumprimento coativo da espórtula cristã. Mas, depois disso, dirá alguém que tais coisas só acontecem no Brasil. Não mesmo.
Estava inebriado em Praga (Kafka, etc.). Atravessara a Ponte Carlos (IV, sobre o Moldávia). E como todo turista acidental caminhei até a Prefeitura para, pacientemente, aguardar que o Orlof, relógio astronômico medieval famoso (1410) que mostra a posição do sol, constelações, planetas, quando fosse meio-dia, começasse a soar músicas e a dança de bonecos, tal como o Relógio de Munique. Aperta aqui e lá, ainda consigo fotografias razoáveis. Feliz, saindo da multidão, a turma se dirige a um bar sôfrega por um canecão de chope. Depois dos cânticos e salvas apalpo o traseiro (bolso) em busca dos euros. Qual? Haviam se escafedido ao namoro de mão levíssima. Alguém empresta, pago no hotel. E ao fim e cabo gargalho vaidoso pois a Europa se curvava ao Brasil.