O vinho dos Marimon
Quero ainda retornar ao Seival. O ônibus para Pelotas fazia parada. Um córrego lento d’água e trilhos. Lembro as campanhas eleitorais, a rua principal; o clube e os discursos no cinema; Nei Cunha, líder do feudo trabalhista; as famílias tradicionais, Floriano Rosa e outros que pediam ao prefeito Ferraz a construção de cemitério. Mas, principalmente o vinho dos Marimon.
Certa vez, levei aos confrades do Barranco exemplares do “Conde de Seival”. Hoje se louvam os plantadores de uva e suas produções. Bagé é referência. Alguns desconhecem que Seival foi o embrião desta história. Isso acessa quando jornal da capital reproduz notícia de 19 de março de 1923, portanto cem anos antes, sob o título “A cultura da vinha no município de Bagé” e que transcrevo por seu valor como memória:
“Esteve em Bagé, em missão de seu cargo, o dr. Celeste Gobatto, diretor do ensino ambulante de agricultura da Escola de Engenharia. Durante sua estada ali, aquele engenheiro agrônomo fez uma inspeção minuciosa aos vinhedos do sr. J. Marimon e Filhos, que são, como se sabe, os maiores existentes neste Estado, ocupando uma extensão de 32 hectares. O sr. Celeste Gobatto constatou o excelente estado dos vinhedos, nos quais predominam as qualidades de uvas Seibel 2, Campo da Paz, Assis Brasil, Herbermond, Black Juli, que dão perfeitamente nas terras dos referidos viticultores. Quanto à produção de vinho, está calculada em cerca de 1.000 hectolitros, sendo que as uvas têm uma média de açúcar de 20 a 21 por cento. O dr. Celeste Gobatto constatou, ainda, o modo como é bem cultivada a vinha e como se acha montada a cantina, cuja produção é vendida nos municípios do Sul do Estado.”
O italiano Celeste Gobbato, hoje nome da rua onde estão órgãos do Poder Judiciário, foi grande enólogo, professor, intendente de Caxias, deputado estadual e defensor dos agricultores. É considerado o pai da vitivinicultura. Deram-se conta? Não é o momento dos pesquisadores, jornalistas, historiadores, acadêmicos que preparam os TCC e plantadores de videiras, aprofundarem estudos sobre a importância desta empresa? O lugar e os descendentes destes pioneiros estão aí, em Seival, no bairro São Judas, onde morava João Marimon, parceiro em refregas políticas.
* Também cem anos atrás, por ordem do presidente do Estado Borges de Medeiros, o coronel Tupy Silveira, intendente municipal de Bagé, já vinha mandando os seus subordinados aliciarem elementos nos distritos rurais para a organização de um corpo provisório da Brigada, que estacionaria nesta cidade. Do quadro de oficias deste corpo, fariam parte os Srs. Antonio Nunes Garcia, major fiscal; Bento Gonçalves da Silva, Delmar Vieira Diogo e outros. O comandante para esse novo grupo provisório da Brigada viria da capital, segundo um periódico. Era a Revolução de 1923 que se avizinhava.
As notas constam da coluna de Renato Bohusch, “Há um século no Correio do Povo”, dos dias 14 e 15 de março, importante fonte de referências históricas.