ELLAS
Quem está te levando para passear?
Dilce Helena Alvez Aguzzi – psicóloga clínica
por Viviane Becker
Há um tempo escrevi esse artigo e agora, ao revisitá-lo, percebi que é oportuno (e necessário) republicá-lo aqui, no Ellas, caderno que gosto tanto.
Sempre que algo diferente de nossa vontade, consciência, ética ou valores está nos controlando, contrariando e oprimindo, vem-me à mente uma imagem urbana bem frequente. Trata-se daquelas pessoas que saem para levar o cachorro para passear, entretanto, só elas pensam que estão no comando, mas quem as conduz é o animal de estimação. Ele que escolhe a hora, o caminho, a velocidade da marcha, as paradas, tudo. Alguns são literalmente arrastados num passo mais ligeiro que gostariam.
Fico pensando em quantas situações impostas, permitidas por nós mesmos, são o equivalente ao alegre labrador que, com sua robustez ofegante, nos arrasta vida à fora:
- O medo de frustrar os filhos, dando-lhes o poder de decisão sem maturidade, abrindo mão da autoridade que os fariam seguros e resilientes.
- O receio de decepcionar os outros, dizendo sim, enquanto a alma está gritando o limite já ultrapassado.
- Acompanhar as loucuras da moda, mesmo que contra nosso próprio gosto e estilo, só por medo de parecer ultrapassado.
- Demonstrar felicidade constante, embora sozinho no banho as lágrimas fluam sem permissão.
- Cumprir pré-requisitos sociais, mesmo que exausto e sem objetivos autênticos.
- Status quo, beleza, juventude, magreza, carro novo, casa, férias no lugar certo, mesmo que sirvam somente para estressar-se afim de mantê-los sem nada usufruir.
- A tecnologia, que nos escraviza, nos mantém ligados em tempo integral, informado sobre banalidades e alienados de nosso centro.
- A vida alheia, a opinião alheia representada pela aprovação nas redes sociais.
Estereótipos de todo tipo, politicamente correto, rebelde sem causa, intelectualóide sem leitura ou sem produção. A exigência de militância pode ser uma pressão externa e vazia de significado.
Ou será que do outro lado da coleira que seguramos está o velho hábito, a preguiça, o eterno procrastinar das decisões importantes, de sermos importantes, de ouvirmos a nós mesmos? Ou seria o medo, o pânico ou a ansiedade que estão nos forçando a escolhas tortuosas?
Talvez não seja nenhuma dessas pressões da vida moderna, mas vale à pena pensar um pouquinho e tentar descobrir quem está te levando para passear?