É coisa nossa
O leitor deve ter escutado sobre Congonha, que marchava com a bandinha; ou Lucas Bilheteiro, que sempre oferecia algum premiado; o Pica-e-Vira; Coruja, o Avança; quem sabe riu das “estórias” do Abelardo. Do Caminha, do Pipoqueiro, Piá, Direção; do Tibúrcio ou do Graxaim? Lembra-se da canja americana? Pois, como muitos outros, eram personagens que circulavam pelas ruas há anos, alegrando com suas excentricidades, sustos ou risos, a adolescência ou maturidade de uma época.
Em setembro festejam-se os 40 anos da publicação de uma obra seminal da literatura bajeense, infelizmente esgotada: “Tipos Populares de Bagé”, de João Coronel Sais. Nela o autor relata, em estilo formal, às vezes jocoso, a biografia de 50 figuras que habitaram nossas avenidas, trazendo graça ou respeito, folclóricas algumas, mas que encenaram momentos peculiares da memória local. Acentue-se que, além das referidas, o escritor se debruça sobre outras de presença histórica, como o Preto Caxias, João Turco, Mãe Luciana, Bola Madureira, o Príncipe Negro (Custódio Joaquim, que teria originado o nome do Passo), o Judeu Francês (José Brunschvig), e outros. O prefácio do livro é do reverendo Antônio Guedes e foi editado em 25 de setembro de 1984, pelo Departamento de Artes Gráficas da FunBa.
João Coronel Sais, advogado, professor, economista, inspetor fiscal, que usava o pseudônimo de Wenceslau Muniz em seus artigos no Correio do Sul, é cidadão a quem Bagé muito deve, na criação de numerosas entidades (construção do prédio do Clube Recreativo a que presidiu, Clube de Caça e Pesca, CTG 93, Associação de Cultura Técnica e Econômica, Faculdade de Ciências e Letras, comissão central para fundação das faculdades de Agronomia e Veterinária, Faculdade de Ciências Econômicas, etc.). Seus textos jornalísticos tinham a epígrafe “Bagé, desperta e luta”, sempre pugnando pela instalação do Ensino Superior na cidade. É inquestionável que tais escritos ressoaram muito quando da criação das faculdades em Bagé. Vereador reeleito, presidiu a Câmara Municipal.
Almeja-se que Leonidas, Paulinho e Beto Coronel, sucessores do ilustrado pesquisador, chancelem a reedição desta obra tão relevante. Aliás é salutar que outro escritor produza um conteúdo com tipos contemporâneos. Curioso: aparenta-me que não sejam tantos como no passado.
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O conterrâneo Miguel Gularte continua a afirmar-se como um dos melhores gestores nacionais no comércio de carnes e frigoríficos. Depois de exitosas passagens na administração de empresas gaúchas e uruguaias, recente notícia publicada na revista Veja afirma que “a Sadia, principal marca de alimentos na BRF, reduzira em 92% o prejuízo com perdas de produtos e insumos desde a chegada do presidente Miguel Gularte, em 2022”. Aliás, vale consultar as redes na internet para constatar o sucesso do empresário bajeense. Parabéns para Miriam, José Heitor, Maria Tereza, Maria de Lourdes e demais familiares! Lá nos verdejantes campos do céu, o saudoso Miguel estará sorrindo, satisfeito com o êxito de seu descendente.
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Há sempre prazer novidadeiro na releitura de livro. Descobre-se um detalhe, dado, algo que tenha escapado da atenção anos atrás, agora visível pelo trânsito da experiência ou da cultura. Ocorreu-me em relação a Érico Veríssimo. Na revisão de “O tempo e o Vento” consegui localizar determinada técnica bastante usada pelos romancistas. Para não saturar que os fatos históricos sejam narrados pela personagem principal cria-se outra, lateral, onde se desaguam episódios da época. No “Continente”, Carl Winter, médico das famílias Terra Cambará, serve-se de uma pessoa existente (Carlos von Koseritz) para revelar acontecimentos da época. Outra, Mingote Caré, de presença efêmera, torturado numa refrega, cai sem forças “no chão de uma estância portentosa que começava em Bagé e entrava Uruguai a dentro: diziam que o dono dela podia ir de sua a casa até Montevidéu sem sair de suas terras”. Érico se referia a João Antônio Pereira Martins, o Visconde de Serro Azul, cujos campos iam de Candiota a Cerro Largo, abrangendo as estâncias do Espantoso, Lata, Aceguá, Rio Negro, Cerro, Boa Vista, Estância Nova, Massangano e Penharol. Também o mesmo se disse, outrora, de terras de Domingos Faustino Correia, o Comendador Correia; e da família Mércio.